Painel de Demanda e Preços Teros: efeito do lockdown e evolução da crise

A grande incógnita da atual crise do ponto de vista econômico é sua duração e seu impacto na demanda de preços de produtos, serviços e de segunda ordem. A despeito da discussão política nesse ponto, é certo que a pandemia do COVID-19 alterou profundamente hábitos de vida e de consumo de curto prazo e não é clara a dimensão desse movimento e em que medida isso será retomado

Estamos falando de um horizonte em dias e semanas, o que explica a incerteza nesse momento e o encurtamento brutal do horizonte de planejamento.

 

Em um cenário tão incerto e sendo tão necessários parâmetros para a condução dos negócios, a Teros decidiu abrir temporariamente ao público alguns dados e análises de curtíssimo prazo hoje disponibilizados apenas aos clientes dos produtos Reajuste e Expansão. Esses dados permitem minimamente acompanhar esse processo em curtíssimo prazo, para que as empresas entendam o que está ocorrendo em termos de demanda e possam conduzir suas estratégias de caixa, gestão de preços e dimensionamento de suas equipes. Nosso objetivo é contribuir para evitar decisões erradas e minimizar o impacto social da crise. Ao longo da semana, dados com maior defasagem serão incluídos na análise, dando um quadro adequado de como está evoluindo a economia doméstica. Acesse a área de Artigos de nosso site para acompanhar.

 

A) Gasto das famílias:

 

Cartão de crédito

 

  • Boom de consumo na semana passada, com aumento dos gastos de quase 50%, seguido de uma forte retração na margem, que ainda está acelerando. Na última semana, o nível de gastos está por volta de 10-15 pp abaixo do esperado.
  • Famílias usaram o cartão de crédito para financiar estoque de bens no processo de preparação da quarentena, já que o movimento não se repetiu no débito.

 

Fig. 1 abaixo mostra a evolução da Antecipação de Recebíveis de Cartão de Crédito dos Lojistas ao longo do último mês, com dados até 25/03/2020. Tal valor representa uma proxy do movimento do varejo nesses dias, contaminado por alguma estratégia de busca por liquidez dos grandes grupos. Como se observa, o que se verificou foi um aumento exacerbado de valores transacionados em cartão de crédito a partir do dia 12 de março, com um pico no dia 18 de março (na semana, aumento de quase 50% nas transações). O recuo até agora normalizou a situação, mas na margem (dados diários), verifica-se uma forte queda adicional.

 

Fig. 1: Volume total de Antecipações de Recebíveis – média móvel semanal (R$ mil nominal)

Fonte: CIP. Elaboração Teros

Cartão de débito

 

  • Aumento muito menor de transações na preparação da quarentena, sugerindo que famílias ou não tinham saldos para financiar estoques ou priorizaram preservar liquidez no primeiro momento.

  • Queda na margem de mais de 30% ontem sugere retração ainda maior nos próximos dias, em linha com a liquidação de transações de crédito não antecipadas mais recentes, sugerindo retração muito acentuada de serviços pessoais spots e alimentação fora de casa (pagos majoritariamente com débito).

 

Esse ajuste pode ser visto nas operações liquidadas com cartão (que representa operações de crédito de ao menos um mês atrás, mas soma as operações imediatas de débito), na Fig. 2. Tal indicador que vem mostrando substancial deterioração de volumes, mostrando uma forte retração na margem, de quase 30%, a despeito do débito representar menos da metade das transações em valor. Note-se que esse mercado não foi quase impactado pela corrida de consumo da semana passada, sugerindo que as famílias se endividaram no cartão para financiar a compra de estoques de alimentos e produtos de primeira necessidade.

 

Fig. 2: Liquidações de Cartões – média móvel semanal (R$ mil nominal)

Fonte: CIP. Elaboração Teros

Boletos

 

  • Meio de pagamento associado ao consumo de serviços pessoais recorrentes e de consumo das empresas. Mostra uma retração muito acentuada, de quase 60% na margem (30% na média da última semana), indicando que famílias e empresas podem estar represando pagamentos na incerteza do cenário.
  • Processo ainda acelerando indica que melhoria do mercado nos últimos dias não se refletiu minimamente nas expectativas dos agentes, implicando um desafio para inadimplência.

 

Fig. 3: Liquidações de Boletos – média móvel semanal (R$ mil nominal)

Fonte: CIP. Elaboração Teros

B) Hábitos de vida

 

Um aspecto extremamente importante é acompanhar as mudanças de hábitos dos consumidores sob stress. Isso impacta o perfil de consumo acentuadamente e modifica fundamentalmente o posicionamento de preços de portfólios de produtos das empresas. A Teros divulgará uma série de artigos ao longo dos próximos dias sobre o tema, com indicações de mudanças, timings e tempos de reversão.

 

Nesta visão mais agregada, destacamos:

  • Aumento impressionante no uso de dados (internet) pelas famílias, em linha com maior tempo disponível no domicílio. Este indicador é o que primeiro reagiu à mudança de hábitos das famílias, constituindo-se em um bom indicador antecedente em um processo de volta à normalidade.

 

Dados mostram claramente uma aceleração grande no consumo diário de Terabytes no mês de março (em torno de 25%), e que ainda está em processo de aceleração, mesmo em São Paulo ou Rio de Janeiro. Cidades como Brasília e Belo Horizonte tiveram acelerações ainda maiores (+50%) com disparadas em momentos distintos do mês, em linha com as decisões de lockdown em diferentes cidades.

 

Fig. 4: Consumo de dados – Terabytes

Fonte: IX

  • Mudança na curva de consumo de energia, com aumento substancial do gasto energético doméstico, indicando a dimensão do lockdown no país.

 

Dados mostram que houve uma mudança substancial no perfil de consumo em relação ao histórico, com queda do consumo relativo no horário comercial (8-18hs) e aumento nos horários típicos de consumo domiciliar. Como o consumo residencial equivale a cerca de 30% da demanda, a estimativa é de uma queda média de 2,4% no consumo domiciliar total no SE/CO em uma semana. Vale lembrar que, na média, consumo de energia elétrica e consumo das famílias estão intimamente relacionados.

 

Fig. 5: Desvio do consumo de energia em relação ao Projetado

Fonte: ONS. Elaboração Teros

  • Consequente aumento dos pedidos por e-commerce/apps é muito significativo, com tendência a dobrar de tamanho.

 

Dados mostram que interesse por serviços de entrega ou delivery entre duplicaram ou quadruplicaram nas últimas duas semanas. Como esses dados são de buscas, é provável que boa parte se refira a novos clientes para o serviço, em novos nichos, e não o usuário habituado aos serviços de entrega, de sorte que o crescimento médio deva ficar mais próximo do piso desse intervalo.

 

Fig. 6: Aumento do interesse por compras remotas – dados semanais

Fonte: Google Trends

C) Atividade produtiva

 

Gasto de energia elétrica na produção

 

  • Queda no consumo de energia nas atividades comerciais e industriais estimada da ordem de 27,9% na semana (Sudeste e Centro Oeste) em relação à semana anterior mostra que impacto sobre produção será substancial. Em outras regiões, impacto foi menor, com o Sul registrando queda de 23,3%.

  • Dados mostram um deslocamento acentuado da curva de consumo de energia elétrica para baixo, com maior impacto no horário comercial, o que permite estimar uma queda mais acentuada da demanda de negócios.

 

Fig. 7: Consumo total de energia elétrica – dados diários Sudeste/Centro Oeste

Fonte: ONS. Elaboração Teros

  • Ao longo do mês, queda estimada para consumo empresarial é ainda maior. Queda maior no sul associada a queda também na demanda doméstica, em linha com a redução das temperaturas médias (e uso do ar condicionado).

 

Dados mostram uma rápida reversão da curva de consumo de energia elétrica nas duas principais regiões produtoras do país (e até agora as mais afetadas pelo locdown). As quedas revertem um processo de crescimento e acumulam reduções na margem de cerca de 20% no SE/CO e 22% no Sul.

 

Fig. 8: Consumo total de energia elétrica – média móvel semanal Sudeste/Centro Oeste

Fonte: ONS. Elaboração Teros

 C) Conclusões

 

  • Queda na atividade econômica ainda está em curso. Necessário aguardar dia a dia para começar a ter uma ideia do fundo do poço e de velocidade de reversão. Mas dados de consumo de energia já sugerem retrações marginais menores nos últimos dias, especialmente no SE e Sul. Nas demais regiões ainda se espera um significativo processo de ajuste.
  • Teros manterá os dados disponíveis diariamente para permitir que as empresas acompanhem esse processo e possam planejar suas ações.
  • Serviços é claramente o segmento mais afetado, mas contas mensais parecem ter entrado no processo de entesouramento de famílias e empresas, indicando algum grau de contágio. Queda na atividade se dá a despeito da venda acentuada de bens na última semana como parte do processo de estocagem prévio ao lockdown.

 

Recomendações

 

  • Cenário se mostra particularmente desafiador, já que há uma mudança muito abrupta de parâmetros de custo (dólar e custo de capital), liquidez, preferências de compra (stress do consumidor) e níveis de produção simultanelamente.
  • Neste momento, individualmente, o equilíbrio de nash enquanto não se tem um horizonte definido é “sentar no caixa”, apertando ainda mais a liquidez das empresas e famílias no agregado. Otimismo e pessimismo do mercado financeiro – que reflete a preocupação com o custo do processo – oscilará em função da maior ou menor certeza quanto ao horizonte de retomada. O mesmo vale para a disposição a gastar das firmas e consumidores.
  • Enquanto este cenário persistir, estratégias defensivas de pricing são as mais adequadas. Em termos gerais:

 

  1. Entender que a dinâmica não é idêntica entre regiões é essencial para minimizar perdas.
  2. Entender a essencialidade do bem final na hierarquia do consumidor é fundamental para definir a estratégia adequada de preços neste momento. Em linhas gerais, nossa recomendação é que repasse de preços e margens neste momento pode ser feito apenas nos itens menos essenciais, com forte impacto sobre vendas, mas importante para posicionamento.
  3. Promocionamento para gerar caixa deve ser usado com cuidado. Há uma gama de produtos em que isso é factível. Em outras é apenas desespero, com efeitos de longo prazo.
  4. Defesa de caixa passa por manter ativação de produtos e aproveitamento usual nessas situações de melhora na qualidade média do mix de marcas comprada por clientes em situação de stress.
  5. Serviços têm um cenário incrivelmente desafiador. Duração da crise é essencial para avaliação do impacto e grau de desmobilização de ativos. Acompanhar a dinâmica de consumo será essencial para entender o novo equilíbrio.
  6. Inadimplência deve pressionar o caixa nos próximos meses, de modo que uma gestão adequada dos meios de pagamento é essencial para uma gestão adequada de risco.

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